Farinha pouca, meu pirão
primeiro. Assim diz o ditado que tenta explicar as dificuldades de se negociar
divisão de ganhos. Na agricultura não é diferente: quando uma cadeia de produção
tem várias etapas, cada parte quer ficar uma fatia maior do bolo. Desde o
supermercado que vende o leite na prateleira, passando pela indústria que
beneficia e embala, pelo produtor rural que tem as vacas, até a fábrica de ração,
cada um quer ganhar um pedaço maior, deixando menos para o outro. Isso tudo num
mercado onde os preços oscilam. Fica a pergunta: dá para ter alguma ordem nessa
bagunça? Como ter mais clareza e estabilidade na negociação de preços na
agricultura?
O CONSECANA, uma
associação de plantadores de cana e donos de usina, é um dos grandes modelos
para a negociação de preços. Lá reunindo quem compra e quem vende cana-de-açúcar
foi criado um modelo para fixar o preço da cana com base nos preços do mercado
de açúcar. Muita gente quer copiar o sistema porque parece justo. A cadeia
produtiva da laranja tem tentado algo parecido, batizado como CONSECITRUS mas não
há consenso entre as partes. É preciso, porém, saber que sistemas como estes não
necessariamente trazem mais ganhos diretos ao produtor rural, antes são
ferramentas de transparência e estabilidade que permitem certa previsibilidade
e poder de negociação. E a negociação é que pode, ou não, trazer ganhos.
A grande questão que
paira é se um modelo destes negociado entre as partes é possível de ser copiado
para outros setores, o que daria mais transparência e previsibilidade. E a
resposta tem a ver com o histórico de um setor extremamente regulado como a
cana, onde o elo mais fraco, os agricultores, tinha uma cultura de organização
que vem desde a época de Getúlio. Para funcionar, tem que fortalecer a
capacidade de coordenação dos produtores. No caso do leite, uma das cadeias
mais pulverizadas na parte da produção primária, seria difícil definir isto por
acordo entre as partes.
Pensando nessa questão,
o Congresso propôs uma lei que obriga os laticínios a informarem, antes do
começo do mês, o preço que pagarão pelo leite recebido do produtor rural. Parece
ser uma ferramenta útil para permitir a comparação e evitar práticas
desonestas. Foi aprovada, só falta a Presidenta Dilma sancionar para ver como esse
arranjo se comporta em tempos de grandes oscilações, ou seja, se os
compromissos serão honrados pelas partes.
Ter transparência nos
preços é possível. Ajuda a dar estabilidade para as negociações e pode ser uma
ferramenta útil para evitar a manipulação dos preços contra o produtor rural. Não
se pode, todavia, esperar que isso salva setores que têm problemas crônicos de
competitividade e que precisam se reestruturar. E mais do que tudo, para que
haja sistemas como o CONSECANA, pactuado entre os dois lados, é preciso
fortalecer a organização e representação dos produtores de cada uma das cadeias
produtivas.