Antes do Golpe de 64 havia uma vibrante discussão em torno da reforma agrária no Brasil. Não era um assunto só dos grandes pensadores, mas estava presente em toda a sociedade, ora como alternativa viável, ora como um fantasma que assustava os proprietários - o caso mais emblemático eram as Ligas Camponesas que ocupavam fazendas no nordeste do país. Veio o Regime Militar, junto com ele a repressão e um discurso de modernização do país. A agricultura não ficou de fora: saiu de um sistema pré-capitalista para uma forte integração com o mercado.
Para explicar o que aconteceu na agricultura do país, estudiosos brasileiros usaram o conceito do cientista político Barrington Moore - Modernização Conservadora - , o qual fora cunhado para explicar o avanço do capitalismo em países como Alemanha e Japão, com consequências sociais distintas de países como França e Inglaterra. José Graziano, hoje presidente da FAO, foi um destes acadêmicos que demonstrou que a agricultura brasileira estava se integrando ao mercado, apropriando tecnologias avançadas ao mesmo tempo em que mantinha ou acelerava a desigualdade social, e assim tentava enterrar a reforma agrária.
Embora tenha trazido uma explicação útil, o termo modernização conservadora na agricultura brasileira, acabou caindo na vulgaridade. Seu uso passou a ser cada vez mais para mostrar os problemas do campo. Existem vários: êxodo rural acelerado inchando as grandes cidades, desigualdade social, dependência de insumos, aumento dos riscos para o agricultor. Só que nesse afã de tudo condenar acabou jogando o bebê junto com a água. É preciso reconhecer que a produção de alimentos aumentou muito, junto com a produtividade da agricultura, e não foi só nos bens de exportação como costuma ser dito. O Brasil é um dos países onde o trabalhador menos gasta seu salário para comprar alimentos. Os alimentos ficaram acessíveis e a oferta de proteínas de qualidade explodiu.
Está na hora de uma revisão nas análises mais rasteiras. Focou-se muito em "conservadora" e pouco em "modernização". As duas estiveram interligadas. Se quisermos um modelo de desenvolvimento mais justo e inclusivo é preciso saber como aproveitar as vantagens que a modernização da agricultura trouxe, sem descartar seus benefícios, ao mesmo tempo em que se buscam alternativas mais justas com mudanças necessárias. Os alimentos de qualidade, a preço baixo é um benefício que o Brasil conquistou e beneficia os menos privilegiados, e sua oferta tem tudo a ver com a modernização da agricultura. A modernização foi sim muito conservadora, mas hoje é possível torná-la
mais justa sem deixar de lado seu aspecto moderno.