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terça-feira, 30 de abril de 2013

Cacau: o renascimento de uma lavoura


O cacau já foi importante no Brasil. Sua riqueza transformou regiões e influenciou, até mesmo, a literatura. Quem não se lembra dos barões do cacau dos livros de Jorge Amado? Não é segredo, porém, que essa riqueza se foi, levada pela decadência. Ocorre que a lavoura parece estar renascendo. Vejamos como.

         Foi no fim do século XIX que o cacau iniciou sua expansão no Brasil. O objetivo era atender as exportações que cresciam. A industrialização e urbanização, principalmente na Europa, criaram mercado para o chocolate. O sistema de produção era quase que um extrativismo, com poucos tratos na lavoura, desleixo esse que persistiu ao longo de décadas.

         Percalços não é novidade para o setor. Um deles levou à criação, pelo governo federal, nos anos 50, da Ceplac, órgão referência em pesquisa e extensão na cacauicultura. Uma crise, no entanto, foi marcante: a infestação, nos anos 80, da praga da vassoura-de-bruxa no sul da Bahia, principal região produtora. Desde então, a produção entrou em declínio.

            Essa queda se deu enquanto o Brasil consolidava seu parque industrial de derivados de cacau. Dimensionadas para o período do auge, as indústrias passaram a importar matéria-prima. Em 2007, o Brasil produziu 201.651 toneladas de cacau e teve de importar 91.191 toneladas. Nesse pico, as importações abasteceram 31% do mercado.

         Hoje, todavia, o cacau renasce. Puxado pelo aumento no consumo interno de chocolates, que cresce 12% ao ano, e apoiado no pacote tecnológico da Ceplac, o setor luta para voltar a ser grande. A produção que tinha caído a 170 mil toneladas em 2003, alcançou 248 mil em 2011. Esse renascimento coloca o Brasil numa situação única: é o único país grande produtor e grande consumidor de cacau.

         O mapa do renascimento apresenta diversidades. Se antes a produção estava no sul da Bahia – Ilhéus e Itabuna –, hoje seu maior crescimento é no Pará. O cacau no Pará cresce 11% ao ano, e já é responsável por 26% da produção nacional. A Bahia também se recupera, crescendo 5% ao ano. Chamam a atenção, ainda, ensaios com cacau no semi-árido, irrigado, onde a produtividade é altíssima, talvez uma promessa para o futuro.

O cacau renasce numa situação diferente. Começamos a ver um futuro promissor. Num mundo que preza a sustentabilidade, a lavoura de cacau – ótima para sistemas agroflorestais e integração lavoura-pecuária-floresta – tem muito a oferecer. Os preços estão aquecidos, os produtores precisam aproveitar o momento. 


segunda-feira, 1 de abril de 2013

A segurança do agronegócio e a governança agrária



(*) Luiz Rodrigues e Jorge Oliveira Jr.
Para produzir, o agronegócio precisa de insumos. Fertilizantes, sementes, empreendedores, máquinas, mão-de-obra, crédito e também ...terra. A terra é um dos insumos mais importantes. Com a alta dos preços, a terra passou a pesar nos custos de produção. Assim se o Brasil quer que o agronegócio continue gerando emprego, renda e divisas, precisa ter um olhar mais atento sobre a segurança jurídica da terra, a chamada governança fundiária.
É importante entender que nossa legislação de terras é herdeira do sistema colonial de sesmarias. O objetivo do sistema e das legislações posteriores foi ocupação de território. Se não fosse isso, pelo Tratado de Tordesilhas o cerrado agrícola não seria brasileiro. A usucapião ampla e a abertura para a grilagem foram uma previsão para que as terras tivessem dono e para que não se alterasse significativamente a estrutura de poder. O objetivo era fazer o Brasil crescer.
Hoje, porém, temos uma situação diferente. As áreas agricultáveis do país ou estão tituladas ou possuem alegação de titularidade, isto é, alguém acredita ser dono delas. Aliás, segundo o jornal Estado de São Paulo, o “Brasil dos cartórios” tem 600 mil km2 a mais que o Brasil real. Aquele objetivo de fazer com que posseiros se apressassem em ocupar o território já está ultrapassado.
Enquanto o processo de ocupação se consolidou nas fronteiras, no centro do Brasil a agricultura se modernizou. Essa agricultura arrojada aporta capital em insumos, muitos deles imóveis ou com alto custo de deslocamento. Portanto, quem investe na agropecuária precisa de segurança, caso contrário os investimentos serão sempre menores que o potencial. Nesse cenário a segurança jurídica é fundamental, inclusive na governança agrária.
Para que isso aconteça não basta aperfeiçoar o sistema notarial com mais supervisão sobre os cartórios. É preciso lembrar que o INCRA não só faz reforma agrária, como também mantém o cadastro nacional de imóveis rurais. Aliás, dos anos 70 aos anos 80, até a aprovação do Plano Nacional de Reforma Agrária, o que o órgão mais fez foi tratar da política fundiária. Ademais, não há outro banco de dados tão rico como o Sistema Nacional de Cadastro Rural, apesar de hoje mostrar falhas por ter sido negligenciado.
Não se trata de, tão somente, inserir o INCRA no centro deste debate. É necessário inserir a política de gestão da terra no contexto da segurança jurídica. Pode ser que, como um órgão nacional, esse seja o ente mais indicado para centralizar e consolidar os diferentes bancos de dados para propriedade das terras. Mas nada impede que a discussão descentralize tais missões. Embora exista possibilidade, o sistema cartorial ainda não tem um sistema informatizado que cruze as informações. Já o INCRA conta com um corpo técnico de especialistas em gestão da malha fundiária e regulação do mercado de terras, que poderia organizar melhor essa tarefa, caso o órgão seja empoderado para tal.
Se historicamente o INCRA não fez essa necessária consolidação e cotejamento de informações não foi por falta de capacidade. Antes, foi uma decisão, implícita, de setores da sociedade, para que se privilegiasse a ocupação de terras em detrimento da governança fundiária. Entretanto, a hora agora é outra. É momento de dar garantias a quem faz investimentos no agronegócio. É tempo de fortalecer a governança fundiária.
Para multiplicar os investimentos no agronegócio é preciso fortalecer o sistema de governança fundiária no Brasil. Isso passa pelo fortalecimento do INCRA, pela motivação de seu corpo técnico e pela sua inserção no centro dos sistemas informatizados que cruzem as informações fundiárias do país. Só assim o agronegócio terá a segurança que precisa para continuar investindo no país.
(*) Engenheiros Agrônomos

sábado, 27 de outubro de 2012

O produtor rural e a recomposição florestal: custo ou oportunidade?




Recomposição florestal custa. E não é barato. Na recente discussão do novo código florestal, um estudioso alertou que se debatia muito o tamanho da fatura e pouco como pagá-la. Ou seja, o produtor que estiver “devendo” floresta vai precisar repor a vegetação semelhante à nativa, e isso tem um preço. Neste momento, no qual haverá a procura por adequação às exigências do código, é importante saber que existem várias formas de se cumprir a legislação. E cada uma dessas formas pode ter um resultado melhor ou pior para o próprio agricultor.
  
Em primeiro lugar é preciso fazer um alerta: embora muitas pessoas pensem que o plantio de mudas de árvores seja a única forma de recompor uma área, isso não é verdade. Normalmente essa forma funciona bem e fica muito bonita na foto, especialmente aquelas com um grupo de pessoas sorrindo e plantando as mudinhas. Mas essa é uma das formas de maior custo. Não se planta milho e soja por muda, porque por semente custa menos. No caso da floresta é parecido: se der para fazer por semeadura e não por muda, é provável que seja mais barato.

Além disso, em algumas áreas em que a mata não foi retirada há muito tempo, e há próximo ao local uma fonte de sementes, talvez nem semear seja necessário. Em muitas situações, basta cercar a área com arame para impedir a entrada de animais, cessar o cultivo, e deixar a vegetação se recompor. O mais importante é saber que existem várias técnicas de recomposição, e que nenhuma delas se mostrou superior em todas as ocasiões. A orientação de profissional habilitado, como um bom engenheiro florestal, pode facilitar o agricultor a cumprir a essa determinação legal de forma mais eficiente a um menor custo.

Para além do custo, é importante ver a situação como oportunidade a ser explorada. Existem empreendedores que estão vivendo somente de florestas plantadas com árvores nativas para produção de madeira de alta qualidade. Como a reserva legal é para uso sustentável e não somente para fim conservacionista puro, o agricultor deve fazer um planejamento para que possa fazer bom uso da floresta e torná-la uma poupança segura para seu futuro. Parte dos custos podem ser amortizados na situação em que, agora, se permite em determinadas condições usar também arvores exóticas, como o eucalipto.
  
Assim, pode-se dizer que recomposição florestal a custos menores facilita a execução de mais áreas com vegetação semelhante à nativa. Ademais, há oportunidades de o agricultor diversificar sua fonte de renda e tornar a reserva legal uma fonte alternativa de recursos. O importante é aproveitar o momento do planejamento da recomposição florestal, para que essa, além dos benefícios à sociedade, possa trazer benefícios ao produtor rural.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Alta produtividade é suficiente na agricultura?


   Na agricultura, a produtividade é um popular indicador de sucesso. Todo mundo quer saber quanto se produz de soja, de milho, de cana, ou de qualquer outra lavoura, em quilos por hectare (Kg/ha). Mesmo em medidas semelhantes, como sacas por hectare, o intuito é o mesmo: entender o uso da terra. Se a produtividade é alta, imagina-se que o uso da terra é eficiente, e portanto, que teríamos uma "boa agricultura".    

    Dessa forma, os produtores rurais foram e continuam a ser incentivados a ter uma boa produtividade em quilos por hectare. Isso vem ocorrendo desde o pós-guerra, período em que "programas de difusão" de tecnologia foram criados pelos governos, e os agrônomos iam, em serviço de extensão, espalhando novas formas de produção. O objetivo dos governos, no entanto, era o abastecimento nas cidades, daí a importância da produtividade. Ademais, sua concepção se deu na Europa, onde há pouca terra disponível para a expandir a agricultura. Mas seria esse o caso do Brasil, o de escassez do fator terra? 

    No Brasil, durante décadas, o custo do capital (juros pagos por quem toma empréstimo) tem sido caro e o custo da terra, relativamente barato. É verdade que essa relação vem mudando com juros menores e preços das terras em alta. Mas será que pode-se dizer que para o agricultor brasileiro a falta de terra é o maior problema? Quantos agricultores não deixam de usar toda a área por não terem crédito suficiente ou máquinas suficientes? Para eles faz sentido falar em quilos por hectares (ou sacas por hectare) como seu indicador de sucesso?  

    Para o produtor rural que faz da agricultura uma atividade empresarial, a verdadeira produtividade é a de reais retornados por reais investidos, ou seja rentabilidade. Kg/ha nem sempre é seu melhor indicador. Pode ser, por exemplo, que o uso intensivo de uma colheitadeira ou a eficiência no uso de fertilizantes e defensivos sejam mais interessantes como medidores de eficiência. O importante é saber o que é escasso ou mais difícil para um determinado agricultor. De qualquer modo, a rentabilidade deve ser ponderada pelo risco esperado. É importante pensar em risco e se precaver. 

    Não é por acaso que pesquisadores que incentivam a intensificação do trigo no estados do Sul do Brasil percebem que, ao longo dos anos em que vários agricultores desistiram das safras de inverno, muitos dos que permaneceram têm "produtividades baixas" em quilos por hectare. Embora produzam menos quilos de trigo por unidade de terra, usam menos insumos, aproveitando melhor o residual da safra de soja e dessa forma são menos expostos a riscos de quebras de safra ou queda de preços.

   Fica claro, portanto, que os indicadores de produtividade - como o de produção agrícola em quilos por hectare -, que servem para os pesquisadores buscarem variedades mais intensivas e para os governos direcionarem o uso da terra, não são necessariamente os melhores para os agricultores buscarem melhores resultados de suas atividades. Podem até ser úteis, porém análises de rentabilidade, de risco, de uso alternativo e de valor presente líquido são mais eficientes e devem ser preferidas pelos agricultores e por aqueles que lhes prestam assistência como cooperativas e escritórios de planejamento.   

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Quinoa: isso ainda vai dar o que falar





Esse grão está fazendo sucesso em todo o Brasil. Não só aqui, mas no mundo todo, adeptos de dietas saudáveis estão comprando a quinoa. É um mercado que não para de crescer para um produto cujo consumo antes se restringia somente aos países andinos como Bolívia e Peru, de onde é originária. Com esse mercado garantido no Brasil, ainda importamos o produto para nos abastecer. 

Ocorre que a mesma quinoa (ou quinua) está em alta entre os adeptos da boa forma breve estará popular também entre os agricultores. Isso porque, muito antes dessa popularização, a Embrapa Cerrados – que busca alternativas de produção para os agricultores – adaptava essa planta para nosso país. E assim conseguiu ter uma variedade de alto rendimento chamada BRS Peabiru.

A quinoa pode ser encaixar como alternativa para a rotação de culturas no Brasil Central. Embora sabidamente necessária, nem sempre é praticada devido a pouca disponibilidade de espécies economicamente viáveis e que se encaixem no sistema de produção. A quinoa parece ser uma alternativa a ser explorada, principalmente por ser de uma família diferente das gramíneas e das leguminosas (na verdade um quenopodiácea, próxima do espinafre). Rotação com plantas de famílias diferentes tendem a diminuir as pragas em comum.

Seu cultivo ainda não decolou, mas mostra grande potencial. A organização da cadeia produtiva pode ser feita por alguma cooperativa que organize contratos com atacadistas do produto. Será um começo. Se der certo, o Brasil vai se tornar um grande fornecedor do produto para o mundo. A cultivar adaptada a Embrapa já tem, e o ambiente é propício. O caminho está aberto.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

Revendo a modernização conservadora da agricultura




    Antes do Golpe de 64 havia uma vibrante discussão em torno da reforma agrária no Brasil. Não era um assunto só dos grandes pensadores, mas estava presente em toda a sociedade, ora como alternativa viável, ora como um fantasma que assustava os proprietários - o caso mais emblemático eram as Ligas Camponesas que ocupavam fazendas no nordeste do país. Veio o Regime Militar, junto com ele a repressão e um discurso de modernização do país. A agricultura não ficou de fora: saiu de um sistema pré-capitalista para uma forte integração com o mercado.

   Para explicar o que aconteceu na agricultura do país, estudiosos brasileiros usaram o conceito do cientista político Barrington Moore - Modernização Conservadora - , o qual fora cunhado para explicar o avanço do capitalismo em países como Alemanha e Japão, com consequências sociais distintas de países como França e Inglaterra. José Graziano, hoje presidente da FAO, foi um destes acadêmicos que demonstrou que a agricultura brasileira estava se integrando ao mercado, apropriando tecnologias avançadas ao mesmo tempo em que mantinha ou acelerava a desigualdade social, e assim tentava enterrar a reforma agrária.

   Embora tenha trazido uma explicação útil, o termo modernização conservadora na agricultura brasileira, acabou caindo na vulgaridade. Seu uso passou a ser cada vez mais para mostrar os problemas do campo.  Existem vários: êxodo rural acelerado inchando as grandes cidades, desigualdade social, dependência de insumos, aumento dos riscos para o agricultor. Só que nesse afã de tudo condenar acabou jogando o bebê junto com a água. É preciso reconhecer que a produção de alimentos aumentou muito, junto com a produtividade da agricultura, e não foi só nos bens de exportação como costuma ser dito. O Brasil é um dos países onde o trabalhador menos gasta seu salário para comprar alimentos. Os alimentos ficaram acessíveis e a oferta de proteínas de qualidade explodiu.

   Está na hora de uma revisão nas análises mais rasteiras. Focou-se muito em "conservadora" e pouco em "modernização". As duas estiveram interligadas. Se quisermos um modelo de desenvolvimento mais justo e inclusivo é preciso saber como aproveitar as vantagens que a modernização da agricultura trouxe, sem descartar seus benefícios, ao mesmo tempo em que se buscam alternativas mais justas com mudanças necessárias. Os alimentos de qualidade, a preço baixo é um benefício que o Brasil conquistou e beneficia os menos privilegiados, e sua oferta tem tudo a ver com a modernização da agricultura. A modernização foi sim muito conservadora, mas hoje é possível torná-la mais justa sem deixar de lado seu aspecto moderno.

sábado, 9 de junho de 2012

Acordos servem para o produtor rural ter melhores preços?





Farinha pouca, meu pirão primeiro. Assim diz o ditado que tenta explicar as dificuldades de se negociar divisão de ganhos. Na agricultura não é diferente: quando uma cadeia de produção tem várias etapas, cada parte quer ficar uma fatia maior do bolo. Desde o supermercado que vende o leite na prateleira, passando pela indústria que beneficia e embala, pelo produtor rural que tem as vacas, até a fábrica de ração, cada um quer ganhar um pedaço maior, deixando menos para o outro. Isso tudo num mercado onde os preços oscilam. Fica a pergunta: dá para ter alguma ordem nessa bagunça? Como ter mais clareza e estabilidade na negociação de preços na agricultura?

O CONSECANA, uma associação de plantadores de cana e donos de usina, é um dos grandes modelos para a negociação de preços. Lá reunindo quem compra e quem vende cana-de-açúcar foi criado um modelo para fixar o preço da cana com base nos preços do mercado de açúcar. Muita gente quer copiar o sistema porque parece justo. A cadeia produtiva da laranja tem tentado algo parecido, batizado como CONSECITRUS mas não há consenso entre as partes. É preciso, porém, saber que sistemas como estes não necessariamente trazem mais ganhos diretos ao produtor rural, antes são ferramentas de transparência e estabilidade que permitem certa previsibilidade e poder de negociação. E a negociação é que pode, ou não, trazer ganhos.

A grande questão que paira é se um modelo destes negociado entre as partes é possível de ser copiado para outros setores, o que daria mais transparência e previsibilidade. E a resposta tem a ver com o histórico de um setor extremamente regulado como a cana, onde o elo mais fraco, os agricultores, tinha uma cultura de organização que vem desde a época de Getúlio. Para funcionar, tem que fortalecer a capacidade de coordenação dos produtores. No caso do leite, uma das cadeias mais pulverizadas na parte da produção primária, seria difícil definir isto por acordo entre as partes.  

Pensando nessa questão, o Congresso propôs uma lei que obriga os laticínios a informarem, antes do começo do mês, o preço que pagarão pelo leite recebido do produtor rural. Parece ser uma ferramenta útil para permitir a comparação e evitar práticas desonestas. Foi aprovada, só falta a Presidenta Dilma sancionar para ver como esse arranjo se comporta em tempos de grandes oscilações, ou seja, se os compromissos serão honrados pelas partes.

Ter transparência nos preços é possível. Ajuda a dar estabilidade para as negociações e pode ser uma ferramenta útil para evitar a manipulação dos preços contra o produtor rural. Não se pode, todavia, esperar que isso salva setores que têm problemas crônicos de competitividade e que precisam se reestruturar. E mais do que tudo, para que haja sistemas como o CONSECANA, pactuado entre os dois lados, é preciso fortalecer a organização e representação dos produtores de cada uma das cadeias produtivas.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Está sobrando dinheiro para o produtor rural?





A agricultura tomou de vez o rumo da sustentabilidade. Um dos programas mais importantes da política agrícola brasileira é o ABC, que direciona crédito a taxas módicas para que o agricultor adote sistemas que mitigam o aquecimento global. Ao mesmo tempo difunde técnicas para promover plantio direto, integração lavoura-pecuária-floresta, recuperação de pastos degradados. Tudo integrado. Só tem um problema: dos R$ 3,15 bilhões disponibilizados na última safra, menos de 500 milhões foram utilizados. Se a taxa é atrativa (cerca de 5,5% ao ano) porque os negócios não deslancham?



Já foi dito que as técnicas não seriam interessantes, não trariam rentabilidade ao produtor, só serviriam aos propósitos ambientais. Todavia o programa foi concebido com a participação de especialistas da Embrapa utilizando somente sistemas de alta produtividade, boa rentabilidade e que já estivessem sendo adotados com sucesso. Plantio direto é consagrado, o que o programa busca é expandi-lo. Tratamento de resíduos animais traz retorno garantido. Mesmo a integração lavoura-pecuária-floresta, que é mais complexa, traz excelentes resultados, como mostra a Fazenda Santa Brígida, de Ipameri, em Goiás. O problema não está nas técnicas requeridas.

Outro ponto levantado é a burocracia envolvida. Sejamos sinceros: este é um programa que dá boas condições com uma contrapartida: técnicas sustentáveis. Ninguém quer pegar dinheiro no banco para ter um uso específico. Quer usar para aquilo que bem entender. Mas a sociedade só concorda em pagar um preço por aquilo que tem valor, e os juros baixos exigem contrapartida. Entretanto é fato que em algumas regiões o legado histórico de nosso sistema de terras impede que os produtores tenham titularidade de suas posses, o que emperra o crédito. O programa Terra Legal tem avançado neste ponto, mas ainda não cobre todos os casos. Sobre os demais documentos exigidos, o sistema bancário pode ter um papel mais pró-ativo em auxiliar seus clientes.  

       O cerne da questão está mesmo é na capacidade de oferecer projetos. Relembro que nos idos do ajuste fiscal profundo, em 1999, um deputado me alertou em um simpósio na universidade: “jovem, quando acabarem os ajustes, virão as grandes obras de infra-estrutura. São necessárias. Mas não se iluda: teremos problemas. Depois de tantos anos parados perdemos a capacidade de fazer projetos”. Aqui parece a mesma coisa. O programa ABC visa levar a agricultura a um novo patamar tecnológico, mas os engenheiros agrônomos que elaboram os projetos desconhecem, na maioria das vezes, tais técnicas. Perderam a capacidade de pensar técnicas, de buscar a inovação, viraram meros despachantes de financiamento. É fundamental recuperar essa função tão importante de projetar e de dar assistência técnica.

O diagnóstico está dado. Os técnicos que implementam o programa já têm clareza do problema. Estão trabalhando para resolvê-lo. Há um calendário repleto de treinamentos e capacitações. Isso nos faz lembrar o livro Implementation, de Wildavsky e Pressman, um clássico das políticas públicas, que mostrava, há décadas, o quanto é complexo fazer um programa chegar na ponta, e quantos ajustes são necessários desde a sua concepção. É o preço que se paga por ousar fazer a diferença. Por ora está sobrando dinheiro, mas se os ajustes no programa continuarem seguindo nesse bom caminho, corre-se um outro risco: faltar recursos para a quantidade de projetos que serão oferecidos num futuro próximo. Esse risco, todavia, é muito melhor para a sociedade que quer um ambiente mais equilibrado. Nesse caso vai ser melhor faltar do que sobrar.

domingo, 20 de novembro de 2011

Agronegócio brasileiro investindo no exterior




     O Brasil é competitivo globalmente em muitos produtos do agronegócio. A carne de frango brasileira está presente no mundo todo. O açúcar, a soja, a carne bovina, a carne suína estão em situação parecida. Não foi fácil esta conquista. Dependeu de se aprimorar a competitividade interna e de se alavancar abertura de mercados no exterior.

     No entanto, dependendo do ciclo econômico, os governos manejam suas economias oscilando entre abertura e fechamento de mercados. Quando a inflação pressiona, importam para aumentar concorrência; quando o desemprego sobe, fecham mercados para tentar forçar a criação de postos de trabalho. O Brasil fechou seu mercado de automóveis para atrair montadoras nos anos 50. As montadoras que aqui não se instalaram, por mais competitivas que fossem, perderam o mercado.

      A Embraer, uma das maiores empresas brasileiras, sabe disso. Por isso decidiu produzir aviões na China. Se a Embraer não fosse para a China, sua concorrente iria. Mesmo sendo montados alguns aviões na China, projetos são desenvolvidos no Brasil, bem como peças e componentes, gerando empregos aqui e garantindo remessas de lucros que impulsionam desenvolvimento de novos produtos. Por fim, possibilita a empresa exportar do Brasil para a China aqueles aviões que não se produz lá.

     Com o protecionismo rondando o mundo, pode ocorrer de portas se fecharem aos produtos do agro brasileiro. Um exemplo são as dificuldades que a Rússia, grande consumidora de carnes brasileiras vem impondo para barrar nossas vendas. Seria lamentável jogar fora a capacidade gerencial e de produzir que se construiu aqui ao longo de décadas, por fechamento de mercados. Temos capacidade de produzir de forma competitiva e agregar cadeias produtivas, mas o protecionismo destrói a economia de escala. A saída? Investir no exterior.

      Se agronegócio brasileiro investir mais no exterior haverá minimização dos riscos de fechamento de mercados.  Não perde, todavia, o controle da cadeia para privilegiar, quando possível, o produto competitivo brasileiro. O JBS e o Marfrig estão nesta linha: abatem em diversos países, mas têm sede aqui. Quando possível o produto é despachado do Brasil. Empresas de açúcar e álcool brasileiras já estão caminhando para investir no exterior, e diversos setores estruturam planos semelhantes. 

      A questão não é pacífica. Há quem questione porque o BNDES apoiou frigoríficos a fazerem aquisições no exterior quando acreditavam que os recursos deveriam ser exclusivamente para investimentos no Brasil. Pode se questionar a qualidade dos ativos adquiridos, mas afirmar que o agronegócio brasileiro não pode investir no exterior é ingenuidade de quem não percebe os movimentos protecionistas mundo afora. Ou se investe, como faz a Brasil Foods na Argentina, ou se perde o mercado. E para ir driblando o protecionismo a saída são os investimentos no exterior. As políticas públicas precisam enxergar essa nova dimensão do agro.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Facilitando as leis para a produção rural

 

        Para viver em sociedade é preciso saber abrir mão. No mundo moderno, além da ética e da moral, a lei e o direito fundamentam as limitações. Não se pode matar, não se pode roubar. Morador pode reformar sua casa, mas esse direito não pode causar dano ao vizinho. Na produção agropecuária não é diferente: há o direito de produzir, vender e comprar produtos agropecuários, mas é preciso pensar no controle das pragas, doenças e na saúde pública, entre outras questões. Se a ação de uma pessoa causar dano a capacidade de o país produzir alimentos e abastecer de forma segura sua população, será limitada.

        Com o objetivo de garantir a sanidade da produção agropecuária, desde a década de 30, o Brasil começou a produzir leis sobre este assunto. Com a modernização agropecuária que aumentou a importância dos insumos, o número de normativos se ampliou. Hoje há um emaranhado, de leis, decretos, instruções e portarias que interferem na produção e venda de produtos agropecuários e seus insumos. Cumprem sua função de preservar a capacidade produtiva do país ao limitar a circulação e pragas e doenças e garantir a qualidade de sementes, vacinas, rações, defensivos e adubos. Mas causam confusão pela desconexão entre eles. Quem precisa conhecer, muitas vezes não sabe como buscar, se perde na longa lista de normas.

        Diante da multiplicidade de leis que tratam de assuntos relacionados, um esforço foi feito. A consultoria do Senado - que conta com profissionais altamente capacitados - realizou um exercício de reunir as diversas leis que disciplinam a sanidade agropecuária. Fez um projeto de consolidação, que é a técnica apropriada para tais casos. O Senador Antonio Russo, do Mato Grosso do Sul, ligado ao setor pecuarista e de carnes, comprou a ideia e deu os passos necessários para que seja efetivada, já estando tal projeto em tramitação nas comissões do senado. Trata-se do Projeto de Lei do Senado nº 592, de 2011. Quando entrar em vigor, facilitará as consultas dos interessados.

        Consolidar é um passo importante. Outro é melhorar a regulação. Para isso é preciso ter conhecimento técnico, o que o ministério da agricultura e diversas secretarias estaduais têm conseguido com a devida estruturação da carreira de fiscais agropecuários que não só implementam como elaboram e atualizam as políticas regulamentares da sanidade agropecuária. Além disso, é preciso saber como regular. Seguir boas práticas de regulação, e neste campo há espaço para avançar. A casa civil tem um programa estruturado de fortalecimento da regulação (Pro-Reg), mas ainda não incluiu a agricultura. Profissionais de fiscalização agropecuária são bastante treinados em sanidade, mas pouco na técnica da regulação. Está aberto o espaço.

           A se continuar nesse sentido, com avanços nas leis e regulamentos, a sanidade agropecuária terá o amparo legal para continuar garantindo a produtividade das lavouras e dos rebanhos brasileiros. As leis e regulamentos ficarão mais efetivos e simples de compreender. É isso que a sociedade demanda, especialmente o agronegócio brasileiro. Ninguém gosta de ter que seguir regulamentos, mas entende quando eles trazem proveito, e é isso que o ocorre com lavouras e rebanhos livres de pragas e alimentos sadios. É um esforço necessário que precisa ser bem disciplinado.